Lei nº 14.382/2022 e o caminho da desburocratização no setor imobiliário

Historicamente, o setor imobiliário tem destacada importância econômica e política no Brasil, como vetor de geração de renda e empregos, e ao longo dos anos oscila entre momentos de retração e crescimento, a depender da economia nacional, mundial e até mesmo de eventos extraordinários como a pandemia de Covid-19. Apesar das oscilações constantes do mercado, os trâmites de transferência de imóveis e a atividade dos cartórios, importante ator deste ecossistema, permaneciam há décadas adormecidos e estagnados no tempo, em descompasso com a evolução do setor e dinamismo dos negócios.

Neste cenário, algumas mudanças legislativas recentes buscaram diminuir o abismo comportamental entre o mercado e a atividade registral. A Lei nº. 14.382/2022 criou a Sistema Eletrônico de Registros Públicos (Serp), com o fim de modernizar e simplificar os procedimentos relativos aos registros públicos de atos e negócios jurídicos, o qual permitirá o acesso a informações e registros pelos usuários de forma exclusivamente digital, integrando as informações de todos os cartórios nacionais, sem que seja necessário comparecimento presencial dos usuários. A exemplo dos bancos, a tendência é que digitalização dos serviços faça com que as conhecidas filas dos cartórios sejam no futuro apenas uma lembrança, o que, seguramente, não deixará nenhum saudosismo.

Para além da importante digitalização dos atos de registro cartorial, como forma de simplificar as operações de transferências de imóveis, a nova legislação limitou a apresentação de documentos e deixou de exigir várias certidões antes obrigatórias, de forma a serem necessárias à transferências de imóveis apenas certidões de regularidade fiscal do vendedor e a certificação sobre a inexistência de ônus reais na matrícula do imóvel, dispensando diversas certidões negativas emitidas pelo judiciário nas esferas cíveis, trabalhistas, criminal e de família, de forma a economizar tempo e dinheiro.

Anteriormente à nova lei, a praxe era que o comprador de um imóvel deveria realizar uma verdadeira due diligence e investigação da propriedade e da vida pregressa dos vendedores, sob pena de ter prejudicada a aquisição do imóvel por dívidas anteriores do vendedor ou do imóvel, podendo inclusive perder o imóvel adquirido para o credor do antigo proprietário.

A nova legislação alterou essa dinâmica e mitigou os riscos do comprador, estipulando que este somente poderá responder por situações jurídicas e dívidas existentes caso estas estejam registradas na matrícula do imóvel adquirido, o que, certamente, traz muito mais segurança à operação de compra, especialmente ao adquirente.

Como consequência da exigência do registro das situações jurídicas e dívidas na matrícula do imóvel, a alteração legislativa faz com que os credores iniciem uma corrida contra o tempo para registrar gravames e a existência de ações e execuções judiciais, visando garantir que seu crédito seja oponível a terceiros e aos possíveis futuros compradores do imóvel do devedor.

Embora a Lei nº 14.382/2022 já esteja em plena vigência desde junho deste ano, muitos compradores ainda se preocupam em pesquisar e obter certidões de possíveis dívidas pregressas, ainda que exista dispensa e mitigação do risco expressamente previsto na nova lei. Fato é que a jurisprudência dos tribunais ainda deverá se assentar acerca da matéria e o conhecimento de todas as situações jurídicas que circundam o imóvel tende a conferir maior tranquilidade ao comprador.

Está atualmente em curso a implementação e regulamentação do sistema Serp pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que já discute a transição ao acesso digital aos serviços de cartório nos termos da Lei nº. 14.382/2022. Resta agora saber se a transição para o Serp se dará em velocidade digital ou a passos vagarosos, como os tradicionais registros cartoriais.

Fonte: https://www.conjur.com.br/

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